“Os homens fazem sua própria história, mas não a fazem arbitrariamente, nas condições escolhidas por eles, mas nas condições diretamente dadas e herdadas do passado” (MARX, 18 Brumário, 1852)
Passados 41 anos do III Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais que ocorreu de 23 a 28 de setembro de 1979, conhecido como Congresso da Virada, se demarca uma ruptura com o conservadorismo profissional ao assumirmos enquanto categoria a defesa dos interesses históricos da classe trabalhadora.
A sociedade brasileira passava por uma crise de decomposição da ditadura e de rearticulação das forças sociais democráticas. A organização e a mobilização regional das assistentes sociais de São Paulo foram consoantes com a expressão das lutas operárias da zona mais industrializada do país, onde se concentrava o pólo mais moderno do capitalismo brasileiro. O III CBAS representou um elo na transição histórica entre a ditadura e o processo de construção democrática no Brasil. Assim como um elo de ligação das assistentes sociais com os trabalhadores, da identificação com as lutas mais gerais da sociedade, e como uma ruptura de um modelo de prática de adaptação, para reforçar uma articulação da profissão com as transformações das relações sociais de dominação e exploração no cotidiano de sua atuação (FALEIROS, 2009).
As implicações do III CBAS para a profissão foram extremamente ricas, tanto do ponto de vista do exercício profissional, quanto da formação. Segundo Mota & Rodrigues (2020), elas repercutiram na revisão dos conteúdos da formação profissional, na aderência às pautas e reivindicações dos movimentos sociais, inflexionando a adoção dos referenciais teórico-metodológicos e temáticas que transitaram da doutrina social da igreja e da sociologia funcionalista para a adoção do pensamento crítico de inspiração marxista. Forjou uma nova cultura profissional que, continha e contém, uma direção social estratégica que colide com os interesses do grande capital, expressa na atuação política das entidades representativas da categoria profissional, nos parâmetros jurídico-políticos da formação e atuação dos assistentes sociais (Códigos de Ética de 1986 e 1993; na lei de regulamentação da profissão 8662/93, nas Diretrizes Curriculares de 1982 e 1996) e na produção teórica mais consolidada da área do Serviço Social.
O processo histórico que ancorou o III CBAS (1979) continha o embrião de um projeto profissional que se consolidaria nos anos 1980, e nos anos subsequentes adquiriria maior nitidez e densidade ético-politica, teórica e técnica – reconhecido então como Projeto Ético Político. Um projeto que tem em seu núcleo “o reconhecimento da liberdade como valor central, o compromisso com a autonomia, a emancipação e a plena expansão dos indivíduos sociais (NETTO, 2009).
No atual contexto de crise do capital, de crise pandêmica e diante do legado de 41 anos do III CBAS, em 2020, fica clara a necessidade de reafirmar coletivamente nossos compromissos, pautados na perspectiva teórico crítica marxiana que tem seu fundamento no compromisso com a classe trabalhadora, e na defesa da vida humana.
Se por um lado temos avanços na concepção e significado social da profissão na defesa dos direitos da classe trabalhadora, a partir das novas condições sócio-históricas do século XXI, por outro, vivemos os limites do processo de produção e reprodução das relações sociais do capital, particularmente nestes tempos que se escancara a dinâmica do capital, profundamente centrada na lógica da mercantilização de todas as esferas da vida cotidiana.
O desafio está posto! Estejamos atentas e atentos, o processo de ruptura com o conservadorismo é continuo e permanente na direção da consolidação do projeto profissional de ruptura. A continuidade desse projeto é um processo constante de lutas, posto que o conservadorismo se reatualiza e a luta pela hegemonia é um processo contínuo em disputa (ABRAMIDES;CABRAL, 2009).
Nestes termos, é urgente destacar a importância de todo o acúmulo teórico, ético- político e técnico- operativo consolidado pelo Serviço Social brasileiro nestes 41 anos, que marcou nossa história no III CBAS/1979.
REFERÊNCIAS
ABRAMIDES, M.B.; CABRAL, M.S. A organização política do serviço social e o papel da ceneas/anas na virada do serviço social brasileiro. IN: 30 Anos do Congresso da Virada / Conselho Federal de Serviço Social (CFESS) (organizador), Conselho Regional de Serviço Social – S. Paulo (CRESS- 9a. Região), Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS), Executiva Nacional de Estudantes de Serviço Social (ENESSO) (co-organizadores). – Brasília, 2009.
FALEIROS, V. P. da. O congresso brasileiro de assistentes sociais na conjuntura dos anos 70. IN: 30 Anos do Congresso da Virada / Conselho Federal de Serviço Social (CFESS) (organizador), Conselho Regional de Serviço Social – S. Paulo (CRESS- 9a. Região), Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS), Executiva Nacional de Estudantes de Serviço Social (ENESSO) (co-organizadores). – Brasília, 2009.
MOTA, A. E.; RODRIGUES, M. Legado do Congresso da Virada em tempos de conservadorismo reacionário. Rev. katálysis, Florianópolis , v. 23, n. 2, p. 199-212, Aug. 2020. Available from http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-49802020000200199&lng=en&nrm=iso. Acess on 18Sept. 2020. Epub July 01, 2020. https://doi.org/10.1590/1982-02592020v23n2p199
NETTO, J. P. III CBAS: algumas referências para a sua contextualização. Serviço Social & Sociedade, São Paulo: Cortez, n. 100, p. 650-678, 2009b.
Texto escrito por Silvia Neves Salazar, professora doutora do Departamento de Serviço Social da UFES, e Natália S. Nicácio, conselheira do CRESS-ES.
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