A PEC 33/2012, derrubada no Senado na última quarta (19/2), seria uma violação dos direitos da criança e do adolescente
Com o folder que diz não para a redução da maioridade penal em mãos, manifestantes comemoram os votos que derrubaram a PEC 33/2012 (Geraldo Magela/Ag.Senado)
A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado Federal rejeitou na última quarta-feira (19/2), por 11 votos a 8, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que reduz para 16 anos a maioridade penal em casos de crimes hediondos, como homicídio qualificado, sequestro e estupro. A decisão pode ser considerada uma vitória para as entidades e movimentos sociais que defendem os direitos da criança e do adolescente, mas como há a possibilidade de se recorrer da decisão, o tema deve voltar a ser debatido no plenário.
“O Brasil já possui legislação específica para a infância e a juventude, que é o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Cabe ao Estado brasileiro implementá-lo em sua plenitude”, afirmou o senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), durante o debate da PEC 33/2012, de autoria do senador Aloysio Nunes (PSDB-SP). A proposta permitiria a aplicação da lei penal para adolescentes, desde que laudo médico comprovasse sua compreensão sobre a gravidade do delito; que a medida fosse reivindicada pelo Ministério Público e julgada por juiz de vara especializada na área; e que a pena definida fosse cumprida em estabelecimento prisional específico.
Parlamentares que votaram contra a PEC rebateram todos os argumentos favoráveis à redução da maioridade penal. Se a questão era sobre a impunidade, ressaltava-se a existência de medidas socioeducativas pelo ECA para atos infracionais (como advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, semiliberdade e internação); se o argumento era sobre a gravidade dos atos cometidos, trazia-se a questão da ausência de direitos, desde a infância, para jovens que cometeram tais crimes; se a intenção era dar uma resposta imediata à sociedade frente ao aumento da violência, rebatia-se com o argumento de que a situação poderia se agravar, ao colocar adolescentes no falido e caótico sistema carcerário brasileiro.
Outros pontos também foram levantados, muitos deles bem explicados no site 18 razões para a não redução da maioridade penal. “O problema da marginalidade é causado por uma série de fatores. Vivemos em um país onde há má gestão de programas sociais/educacionais, escassez das ações de planejamento familiar, pouca oferta de lazer nas periferias, lentidão de urbanização de favelas, pouco policiamento comunitário, e assim por diante. A redução da maioridade penal não visa a resolver o problema da violência. Apenas fingir que há ‘justiça’. Um autoengano coletivo quando, na verdade, é apenas uma forma de massacrar quem já é massacrado. Medidas como essa têm caráter de vingança, não de solução dos graves problemas do Brasil que são de fundo econômico, social, político”, diz trecho do texto.
Parlamentares lembraram também que a PEC 33/2012 afronta leis brasileiras e acordos internacionais, já que vai contra a Constituição Federal, que reconhece prioridade e proteção especial a crianças e adolescentes; é contrária à Doutrina da Proteção Integral do Direito Brasileiro, que exige que os direitos humanos de crianças e adolescentes sejam respeitados e garantidos de forma integral e integrada às políticas de natureza universal, protetiva e socioeducativa; e vai contra a Convenção sobre os Direitos da Criança e do Adolescente da Organização das Nações Unidas (ONU) e a Declaração Internacional dos Direitos da Criança compromissos, ambas assinados pelo Brasil.
Ou seja, para além da questão de mérito da PEC, há também que se debater sua constitucionalidade. E para o senador Randolfe, a redução da maioridade penal é inconstitucional por ferir cláusula pétrea, ou seja, desrespeita direitos e garantias individuais consolidados pela Constituição, que não podem ser restringidos nem suprimidos.
Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) e Aloysio Nunes (PSDB-SP): posições antagônicas sobre o tema (Geraldo Magela/Ag.Senado)
Conjunto CFESS-CRESS é contra a redução da maioridade
Está no Código de Ética: defesa intransigente dos direitos humanos e recusa do arbítrio e do autoritarismo. Só este princípio bastaria para justificar o posicionamento contrário do Conjunto CFESS-CRESS à redução da maioridade penal. Mas o Conselho Federal e os Conselhos Regionais têm levado este debate para a categoria, seja nas assembleias regionais, seja no Encontro Nacional, maior espaço deliberativo. E na 42ª edição desse encontro, foi deliberado no eixo Seguridade Social: “acompanhar criticamente os debates acerca das políticas para a juventude, em especial da juventude negra, afirmando posicionamento contrário ao extermínio e genocídio dessa população e à redução da maioridade penal”. Tal deliberação foi aprovada por assistentes sociais da direção e da base, representando todos os estados brasileiros.
Por isso, o CFESS marcou sua posição na CCJ, distribuindo o folder que explica porque o serviço social brasileiro diz não para a redução da maioridade penal. O material foi inclusive usado como forma de manifestação durante o debate.
Entretanto, é intrigante ver, por exemplo, comentários de pessoas no Facebook questionando um posicionamento definido democraticamente. E é alarmante ver o nível de desinformação dessas pessoas em relação ao Código de Ética, ao ECA e ao debate que o Conjunto se dispõe a fazer.
“É preciso entender que crianças e adolescentes são pessoas de direitos próprios e especiais, em razão da sua condição específica de pessoa em desenvolvimento, e por isso necessitam de uma proteção especializada, diferenciada e integral. A nossa luta não deve ser para reduzir a maioridade penal, mas sim insistir na defesa de políticas públicas para a infância e juventude, defender a implementação do ECA em sua totalidade, inclusive no que diz respeito às medidas socioeducativas para quem comete atos infracionais”, explica a conselheira e representante do CFESS no Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), Erivã Velasco.
O serviço social marcou presença durante o debate (Rafael Werkema/CFESS)
Fonte: CFESS.
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