Para o movimento negro, existir e resistir são sinônimos. E o Dia da Consciência Negra, celebrado hoje, é uma importante data para dar atenção as suas lutas e conquistas. É um dia de reflexão, mas também de ir para as ruas reivindicar direitos e pautas, que foram tomados do povo negro há muito tempo. Mas a luta não se faz em um dia e mesmo sabendo a importância de discutir o Dia da Consciência Negra, a Gestão do Conjunto CFESS-CRESS (2017-2020) vem desde sempre levando as pautas do movimento negro para o centro dos seus debates.
“O projeto ético-político que orienta a nossa profissão tem uma direção social na perspectiva da emancipação dos sujeitos, portanto os/as assistentes sociais são convocados a combater o racismo, uma vez que ele estrutura as bases das desigualdades brasileiras. Nesse sentido, a contribuição ao combate ao racismo se dá pelo exercício profissional, pela apreensão crítica da realidade e pela articulação com os movimentos sociais que tem como direção a construção de uma sociedade antirracista”, explica a Coordenadora da Comissão de Ética e Direitos Humanos do CRESS-17 e Assistente Social Sabrina Moraes.
A Conselheira afirma que os avanços ainda são muito tímidos e, em sua maioria, são frutos da articulação e resistência dos movimentos sociais e da sociedade civil. Para Sabrina, o racismo precisa ser radicalmente combatido. “Não há soluções simplórias pra algo que estrutura as bases políticas, econômicas e sociais do país”.
A Assistente Social, Meyrieli de Carvalho Silva, também concorda com essa posição e alerta que ainda há muita luta pela frente, principalmente, em relação aos retrocessos. “Se analisarmos a conjuntura nacional, percebemos que avançamos muito pouco e, nós últimos 3 anos, após o golpe, chegamos até a perder direitos duramente conquistados. Além disso, tivemos o congelamento, por 20 anos, dos recursos destinados as políticas públicas com Emenda Constitucional 95 e com a destinação do fundo público quase que exclusivamente para o capital. Sabemos que quem sofrem com esses arrochos é a população mais humilde e, por fim, a população negra”.
Realidade Capixaba
O Espírito Santo está entre os estados mais letais para juventude negra e para as mulheres (primeiro no índice de feminicídio da região sudeste e terceiro no país). Estão sob tutela do estado encarcerados 19,4 mil homens e mulheres, em sua maioria composta por negros e negras. No norte do estado comunidades quilombolas são sufocadas pelo grande capital e não tem acesso a terra, a água e ao saneamento básico.
Apesar de tanto sofrimento, temos focos de resistência, como por exemplo, o movimento de mulheres, juventude negra e de acesso à moradia, protagonizaram e protagonizam a construção de uma agenda antirracista em resposta a intensificação do projeto estatal de genocídio da população. “Percebo que esta articulação é um avanço. Penso também, que a reserva de vagas (cotas) no ensino técnico federal e no ensino superior foram importantes na produção de conhecimento, debates e ações na direção da erradicação do racismo. Coletivos universitários criados por jovens negros e negras têm sido um dos principais alicerces para a permanência na universidade. Somente as cotas não são suficientes. É preciso avançar em políticas de permanência, por exemplo”, explica Sabrina.
A criação, em 2012, do Conselho Estadual da Promoção da Igualdade Racial do Estado do Espírito Santo também foi uma das estratégias, no entanto ficou desativado em 2014 e somente em 2016 passou a fazer parte da estrutura da Secretaria de Estado de Direitos Humanos.
Futuro Incerto
Segundo a Conselheira Sabrina, o cenário das eleições nos mostrou que precisaremos, ainda mais, estarmos organizados/as junto aos movimentos sociais. Mas também a entendermos que, toda essa conjuntura, não é de agora e também não se limita às eleições. “Ter um presidente eleito que aplaude o Ustra, que defende que ‘bandido bom, é bandido morto’ fazendo um recorte de quem são os bandidos e qual a cor deles, ainda que não pronuncie em sua fala, ou que defende que violência se vence incentivando mais violência, demonstra pra gente que o conservadorismo tem aumentado ainda mais. Todos esses discursos de ódio tem sido direcionados à uma maioria da população, que tem cor e sexo”.
Esse cenário desafia a sociedade brasileira e escancara o racismo que constitui as bases ideológicas dessa nação. Portanto, as ações e articulações do CRESS – 17 não se iniciam e nem se encerram no dia 20 de novembro. A categoria é convocada cotidianamente a intervir no combate ao racismo e a compor essa luta junto à população atendida, aos movimentos sociais, e aos setores da sociedade comprometidos com o combate ao racismo e com a construção de um novo modelo de sociabilidade.
Campanha
Mas, como um dia apenas é pouco, a Gestão do Conjunto CFESS-CRESS (2017-2020) decidiu abordar essa luta todos os dias do mês de novembro com a campanha “Assistentes sociais no combate ao Racismo”. A Campanha começou com o lançamento de cartazes, um deles traz a frase “Minha fé não é motivo para sua violência”, que denuncia o racismo contra as religiões afro-brasileiras e de matrizes africanas. Segundo um balanço do Disque 100 do ano de 2017 sobre discriminação religiosa, cerca 40% dos registros de denúncias envolvem racismo contra religiões como Umbanda, Candomblé, entre outras.
Para a presidente do CFESS, Josiane Soares, “abordar esse tema é absolutamente necessário para dialogar com a garantia dos direitos de pessoas que estão sofrendo com o crescimento de episódios de violência associadas à sua crença. É sempre fundamental reforçar que o Estado brasileiro assegura liberdade religiosa a todos e todas”, explica.
O outro cartaz que também foi lançado denuncia o racismo que atinge mulheres negras, afirmando que “A violência e a dor miram gênero e cor”. Os dados são alarmantes: as mulheres negras estão entre 58,86% das vítimas de violência doméstica; 53,6% das vítimas de mortalidade materna; 65,9% das vítimas de violência obstétrica; 68,8% das mulheres mortas por agressão; e 56,8% das vítimas de estupros. As informações foram retiradas do dossiê de 2015 chamado Feminicídio: Mulheres Negras e Violência no Brasil, da Agência Patrícia Galvão.
“Esses dados revelam que a violência contra as mulheres negras não são um problema privado, mas sim uma questão de saúde e segurança pública. Além disso, demonstram também que muitas vezes é o próprio Estado quem comete essa violência, principalmente com a população mais pobre do nosso país”, explica a conselheira do CFESS Solange Moreira.
Para começar a semana em que se celebra o Dia Nacional da Consciência Negra, o CFESS lançou ontem o manifesto “Vidas Negras Importam”! Porque racismo se combate todo dia, em todos os lugares, inclusive no exercício profissional cotidiano.
Leia o CFESS Manifesta AQUI
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