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CRESS-ES Entrevista: Mindu Zinek conta sua experiência com o Movimento Nacional da População de Rua (MNPR)

26/08/2021 as 1:00

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No dia 19 de agosto foi celebrado o Dia Nacional de Luta da População em Situação de Rua. E para dar continuidade ao debate sobre esse tema, a gestão “É preciso estar atenta e forte” conversou com o Assistente Social Wesley Cândido Zinek, mais conhecido como Mindu Zinek.

Mestrando em Geografia, pela Ufes, Mindu é natural de São Paulo, morando atualmente na cidade de Serra. Formou-se em Serviço Social pela Universidade Nove de Julho (UNINOVE), em 2013. Três anos antes integrava o Movimento Nacional da População de Rua (MNPR), o que ajudou no seu interesse pelo Serviço Social. Atualmente, atua somente como apoiador desse e de outros movimentos, além de estar envolvido diretamente com as ações da Pastoral do Povo da Rua.

Nesta entrevista, ele nos contou mais da sua aproximação com o MNPR, do interesse pelo Serviço Social, das ações que realizada, atualmente, junto à população em situação de rua e como esse grupo inspirou a sua pesquisa no mestrado. Confira!

CRESS-ES >> Pode nos falar sobre sua experiência na atuação junto ao Movimento Nacional da População de Rua?

Mindu >> A minha relação com o Movimento Nacional da População de Rua (MNPR) teve inicio em São Paulo, em 2010. Nessa época eu estava cursando Serviço Social, e toda compreensão que fui adquirindo sobre a Questão Social e essa contradição histórica do Capital versus Trabalho, bem como as questões étnico-raciais eram evidenciadas de forma muito concreta na relação com as pessoas em situação de rua. Eu ficava impressionado pela forma com que se dava a organização do MNPR, nas formações políticas, assembléias, manifestações, e o protagonismo nas reivindicações junto ao Poder Público em suas lutas e conquistas. “Nada sobre nós, sem nós” era o lema, e assim as Políticas Públicas iam sendo elaboradas de baixo para cima.

CRESS-ES >> Atualmente, não está mais envolvido diretamente com o movimento. Mas como essa participação contribuiu para sua formação profissional, assim como para seus interesses pessoais, até como pesquisador?

Mindu >> Minha opção em cursar Serviço Social se deu pelo envolvimento já estabelecido com esse público, tanto pelo interesse pessoal quanto pelo envolvimento à Pastoral de Rua. A perspectiva da Teologia da Libertação me proporcionou um olhar com um viés mais político e menos caritativo/assistencialista. Na graduação, eu costumo dizer que todo o meu período de curso foi teórico (na universidade) e prático (na rua). Tive professorxs institucionais e professorxs desinstitucionalizades ao extremo. Assim, mesmo quando eu não estou atuando profissionalmente com esse público, a relação de amizade e encontros permanecem cotidianamente, seja de forma pessoal ou nas ações da Pastoral do Povo da Rua. Quando surgiu a oportunidade de cursar o mestrado, o foco da pesquisa não poderia ser outro. Atualmente sou mestrando de geografia na UFES, e optei pelo curso por perceber a necessidade de diálogo do Serviço Social com as análises sobre territorialidade e as dinâmicas sócio-espaciais do fenômeno.

CRESS-ES >> Dentro das áreas em que atua hoje, tanto como pesquisador quanto nas relações de amizades com quem vive na rua e, também, nas ações da Pastoral do Povo da Rua, você ainda mantém contato com essa população. Desse ponto de vista, como avalia que o desmonte das políticas públicas interfere na vida dessas pessoas?

Mindu >> O desmonte das Políticas Públicas tem consequências direta na população em situação de rua. No primeiro ano de mandato de Bolsonaro, uma das medidas mais perversas foi a extinção de centenas de conselhos, incluindo um dos principais órgãos deliberativos da Política dessa população, que foi o Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento da Política (Decreto 7.053/2009) – CIAMP Rua. Além disso, com o corte de verbas dos serviços, ocorre o enxugamento de R.H e consequentemente a sobrecarga dxs profissionais, gerando, muitas vezes, um desgaste interno e até competitividade. Isso tem um impacto direto no público atendido e suas demandas, pois sem profissionais suficientes, conflitos internos, desgastes físicos e emocionais, não há como dar conta das demandas que se apresentam. E como uma “bola de neve” essas demandas, que podem ter origem, por exemplo, na questão do déficit habitacional, ou desemprego, ou falta de vagas nas escolas, acabam se afunilando na Assistência Social, como se esta tivesse capacidade de absorção e resolução.

CRESS-ES >> Ainda diante dessa atual experiência, consegue avaliar como a pandemia afetou as pessoas em situação de rua?

Mindu >> A pandemia para a População em Situação de Rua evidencia algumas questões. Primeiro que o sentimento de risco de morte não foi novidade, pois esse sentimento, historicamente, participa do cotidiano dessa população, como ficou bem claro em uma fala de um jovem: “Se a nossa preocupação sempre foi se vou acordar com vida, ou como vou me alimentar, você acha que vamos ficar preocupados com Covid-19?” Segundo, ficou ainda mais evidente a vulnerabilidade dessa população. Motivo que despertou tantos grupos de solidariedade a uma atuação de assistência nas ruas. Ao mesmo tempo em que o Poder Público reafirma sua incapacidade em lidar com esse grupo populacional. Terceiro, o surgimento dramático de pessoas, crianças, idosos, famílias que foram parar nas ruas por conta da pandemia. Só para citar as principais.

CRESS-ES >> Pode falar mais sobre as ações da Pastoral do Povo da Rua neste contexto de Pandemia?

Mindu >> Desde o início da Pandemia, a Pastoral do Povo da Rua vem desenvolvendo cotidianamente ações de entrega de alimentação, água, cobertas, roupas e kits de higiene. Com o tempo foram surgindo mais grupos e as ações expandiram-se pela região metropolitana. Paralelamente a essas ações, foram elaborados documentos de propostas e solicitações, reivindicações, reuniões e denúncias junto ao Poder Público. Foram – e ainda são – momentos muitos difíceis, dada a morosidade, inércia e burocracias desnecessárias diante de questões extremamente emergenciais, tanto por parte de secretarias do Estado quanto de municípios. Assim, a Pastoral segue nas ações de assistência, defesa, denúncia e formação de novos grupos, na tentativa de minimizar os reflexos e impactos da Pandemia.

CRESS-ES >> E pode nos falar, também, sobre a sua pesquisa e como ela dialoga com a população em situação de rua?

Mindu >> Eu pretendo pesquisar a violência e a morte da população em situação de rua na Grande Vitória pela perspectiva da bio/necropolítica. Quais são os contextos, as motivações, os perpetradores? De que forma o Estado, a sociedade e a mídia se posicionam frente a esses eventos?

CRESS-ES >> Há algo que não abordamos que você gostaria de acrescentar?

Mindu >> Creio que enquanto profissionais precisamos sempre distinguir Serviço Social de Assistência Social. O Serviço Social tem um histórico potente de lutas e estará sempre na frente, contra a lógica perversa desse Estado Neoliberal. A Assistência Social é uma política Estatal dentro dessa lógica Neoliberal, e nosso principal objetivo é revolucioná-la. Minha impressão é de que se tem optado mais pelo alinhamento às agendas políticas municipais e estaduais ao comprometimento com nosso Código de Ética Profissional.

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